Eu queria
fazer um verso pra você musicar
eu queria
fazer um verso pra eu cantar
eu queria
que você tivesse lá pra me ouvir
eu queria
que você fosse o primeiro a me aplaudir
eu queria
jogar fora o rosto de boneca que você tentou me vestir
eu queria
me transformar naquilo que me agrada
naquilo
que me faça rir
mas foi
impossível
foi
impossível
foi
impossível
foi
impossível
a rima
ficou perdida
o falsete
se perdeu no ar
as notas
da minha voz se perderam em alguma vida passada
alguma
vida de merda talvez tão merda quanto essa
o grito
rouco e desafinado nunca me pareceu tão melódico
porque é
isso o que eu escuto
só isso
o que eu escuto
um
estrondo rouco, desafinado, melódico
o som,
aquele som
aquele
som
você
nunca tentou compreender
achou que
era tudo pessoal
(risos)
talvez
fosse mesmo
o que não
é pessoal?
se eu tô
aqui vivendo, é porque se tornou pessoal
sempre
foi pessoal
nós é
que levamos tempo demais pra perceber
levamos
tempo demais pra entender
eu queria
crescer e me transformar em tudo aquilo que você me fazia temer
eu queria
crescer pra jogar meu molotov naquele corpo que você me fez usar
eu queria
crescer pra lamber o veneno que escorria daquela ferida aberta
eu queria
crescer pra quebrar aquele copo vermelho
copo
vermelho
copo
comprido, vermelho
é que
você não entende
não
entende a nota que eu canto
não
entende o falsete na minha voz
não
entende o rasgado nas minhas roupas
não
entende a calcinha velha e manchada de menstruação
não
entende os óculos sujos e velhos
(risos)
não
serei eu a te explicar nada agora
agora
tudo ficou pra trás
toda a
vontade, todo o desejo
tudo
virou raiva
todo o
desejo de um dia ver você na primeira fila
se tornou
ódio e vontade de te chutar pra fora daqui
vontade
de gritar e fazer o amplificador explodir
é que de
repente eu entendi
eu
entendi que jamais fui daqui
todo o
pensamento macabro
toda
vontade de suicídio
todo
sangue que tive vontade de ver escorrer
todo
grito sufocado
todo gozo
escondido
tudo
legítimo!
Violentamente
reprimido!
Violento
é você
violento
era o rosto de boneca que você queria que usasse
violento
era o batom fálico que você queria manchar meus lábios
violento
é o corpo enquadrado que você ainda quer que eu vista
violento
é essa merda que você chama de amor
eu quero
gritar do jeito que eu quiser
quero
dizer que já cresci
cresci e
me tornei tudo aquilo que você me fazia temer
cresci e
jogo um molotov por dia nesse corpo que você queria que eu usasse
cresci e
uso minha língua pra lamber
lamber
gozos que escorrem de fendas abertas em corpos
corpos
bem diferentes daqueles que você queria pra mim
(risos)
minha
vida são cacos de vidro vermelhos...