Essas semanas estão sendo marcadas por muitas polemicas e gritos nas ruas. Tivemos Marcha da Maconha, depois Marcha pela Liberdade, polemicas com o kit anti-homofobia e agora as manifestações pipocando contra o novo Código Florestal.
Eu acho isso tudo muito bonito e bastante válido. Mas fico me questionando realmente o que pensamos que seja liberdade. Uma vez conheci um cara que defendia que ninguém é verdadeiramente livre porque, antes de mais nada, estamos presos em nossa condição humana. Nunca saberemos, por mais q tracemos milhões de paralelos, como se sente um cachorro, uma vaca, um mosquito ou uma sequoia. Nós só somos capazes de perceber e entender o mundo a nossa volta através das nossas percepções humanas limitadas.
Eu acho essa análise interessante. Mas ela é meio ensimesmada, não dá pra fazer muito com essa informação. É apenas algo que se constata e acha-se bonitinho.
Pra mim, a verdadeira análise em relação a liberdade é referente a normas e padrões vigentes. Um bom exemplo pra isso é o velho paradoxo religioso. Se Deus é onipresente, onipotente e, principalmente, onisciente e, portanto, já conhece todas as suas decisões antes mesmo de você as tomar, como pode haver livre-arbítrio? Mas essa mesma lógica se aplica fora dos valores religiosos, no modelo social vigente: se você é educado numa sociedade que te ensina que ser heterossexual, rico, comer carne e ter um diploma de uma faculdade importante são coisas boas e te farão ter uma vida mais feliz, será que você realmente considera isso tudo bom e importante ou foi ensinado a isso?
E aqui eu me recordo das minhas aulinhas de Psicologia da Educação, numa discussão que a professora insistiu em arrastar o semestre inteiro. Ela passou um filme para gente no primeiro dia de aula que contava a história de um menino que fora abandonado, ainda bem pequeno, numa floresta. O menino conseguiu sobreviver, mas caminhava de quatro, rosnava, comia cru. Um belo dia foi encontrado por um médico proeminente que resolveu fazer do menino um de seus ratos de laboratório (não menosprezando o rato, mas tentando mostrar que realmente não há diferenças entre eles). Levou o menino pra casa e, nos anos que se seguiram, fez de tudo para ensinar as regras sociais e o Bê-A-Bá para o garoto. Mas ele não obteve muito sucesso. O menino aprendeu a falar algumas coisas, tinha um vocabulário limitado mas era capaz de se comunicar, mas não conseguiu aprender matemática nem gramática. Ainda tinha surtos de querer sair correndo pelo campo e chegou a fugir de casa algumas vezes.
Mas a perguntinha que a minha querida professora insistiu em arrastar por todo o semestre foi: será que esse menino era de fato um humano educado ou não passava de um bicho adestrado? Ao que eu respondo com outra pergunta: qual é a diferença entre eles??
Para mim parece bastante óbvio que nós, Homo sapiens, somos tão adestrados a nossa vidinha social quanto qualquer elefante de circo. E ainda levamos as mesmas porradas e chicoteadas que eles levam. Cada tapa que uma mãe dá a uma criança por não se comportar bem (o que é se comportar bem?), cada reprimenda da professora por ler gibi durante a aula (não é útil ler gibi? Mas Pedro Bandeira é?), cada castigo por querer andar de bicicleta ao invés de estudar álgebra (não é importante andar de bicicleta?), cada vestido de babado colocado no corpo que nasceu com uma vagina (corpos com pênis são anatomicamente inaptos a gostar de babados?)... todas essas coisas são chicotadas e porradas sociais adestrando os indivíduos. “Fique na linha, obedeça, siga a norma ou sofrerá as consequências” é o que o sistema nos diz.
Eu venho tentando quebrar essas algemas, mas essa é uma tarefa bastante complicada. Porque o sistema nos engloba por completo, esse sim é onipresente. E de repente me pego repensando absolutamente tudo, todos os meus gestos, meu modo de vestir, de falar, de me comportar, meus gostos... Será que realmente gosto disso ou fui adestrada a gostar? Será que, se eu fosse livre realmente me comportaria dessa maneira, ou será que fui adestrada a dar a patinha nesse tipo de situação social? São muitos questionamentos, muitos muros pra por abaixo e muito trabalho braçal pra construir algo novo no lugar.
O que me entristece mesmo é ver o medo e a apatia das pessoas em mudar, como o gado que você abre a porteira do pasto e eles simplesmente não saem. O mundo lá fora é desconhecido e assustador. Por mais que aqui dentro seja ruim, eu sei como lidar com o ruim, o novo eu terei que aprender como lidar. E aprender cansa, dá medo, assusta.
Quebrar as regras de um sistema velho e ineficaz, implementar um onde possamos nos auto regular, gerir nossas próprias vidas, acabar com as diferenças. Pouco importa se você tem conhecimentos de medicina e eu de culinária, porque conseguimos entender o quanto ambos são importantes. Sem hierarquias, sem melhor ou pior, todos irmãos trabalhando para o bem comum.
“Ah! Vai virar bagunça! Como as pessoas vão se comportar se não houverem leis?”.
Olha, eu tenho a tendencia a acreditar no lado bom das pessoas. Mas quer saber, se elas não tiverem lado bom, que se matem! É isso mesmo... Se não formos capazes de regular nossas próprias vidas, vivendo harmonicamente com tudo o que nos cerca, então talvez não devêssemos estar aqui. Nunca vi leis em pedras na floresta ou nas savanas, nunca conheci juízes nos desertos, muito menos advogados nos oceanos. Mas entre os humanos temos tudo isso e muito mais.
Que se matem!
Eu vou começar a fazer a malinha pra ecovila, enquanto isso vamos preparando mais algumas ações de desobediência civil. Aos que ficarem, boa sorte! Mas se você não está na vibe de travar nenhuma guerra santa em nome do Deus do poder e da ganância, será sempre bem vindo na ecovila!
=D
E viva a contra cultura! Viva a desobediência civil! Viva a LIBERDADE!
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