Recentemente eu fiz um amigo que me repetia uma coisa várias vezes. Ele dizia que planeja abandonar seu atual estilo de vida em alguns anos. Ele espera se formar na faculdade, se desfazer da maioria dos seus pertences, colocar uma mochila nas costas e cair na estrada. Eu o questionei, se ele tem realmente essa intenção por que não o fazer agora? Por que esperar se formar na faculdade? O que aquele pedaço de papel idiota prova? E ele me respondeu que realmente não prova nada, mas disse que mesmo para cair na estrada ele precisaria ter um knowhow em alguma coisa.
Eu levei algum tempo para entender o que ele estava dizendo. Não muito, algum.
Quem já viveu essa experiencia, por mais breve e desajeitada que tenha sido, a experiencia de simplesmente colocar uma mochila nas costas e cair na estrada, entende o real significado transformador que ela tem na vida. Estar na estrada assim, dessa forma livre, pedindo carona, fazendo recicla, pedindo um prato de arroz com feijão nos postos por aí, proporciona uma reflexão profunda e sincera sobre a forma que nós, seres humanos, escolhemos viver.
E quando eu digo que escolhemos essa forma de viver, não estou falando das reuniões promovidas pelos “donos do mundo”. Estou falando das nossas escolhas, minhas e suas. É uma escolha diária permanecer vivendo nessa sociedade doente e caótica, é uma escolha diária continuar ingerindo produtos cultivados a base de venenos (para o corpo e para Terra), é uma escolha diária continuarmos banhando e cozinhando com água contaminada com cloro, e lavando nossa pele e pelos com produtos químicos cheirosos, é uma escolha diária respirar o ar que sai dos escapamentos, e caminhar pelo asfalto. Nós escolhemos levar essa vida todos os dias!
Não é de hoje que eu percebo o quão podre, doente e aprisionante é a vida numa cidade. Já algum tempo busco formas novas de viver e interagir. Não é fácil, o sistema as vezes parece nos sufocar. Mas aos pouquinhos a gente vai se arrastando para fora dessa nuvem de fumaça cinza que nos anuvia os sentidos. Vamos descobrindo novas formas de se alimentar, formas éticas, formas que questionam o sistema do desperdício. Descobrimos que já não precisamos mais de determinada roupa ou sapato, aquilo de fato não acrescenta nem traz felicidade, aprendemos a questionar nosso consumismo.
Aos poucos as máscaras vão caindo, a visão vai clareando, e você começa a entender porque nossa sociedade chegou ao atual estado de putrefação em que se encontra. Mas a busca parece não ter fim. Afinal, como podemos construir uma nova sociedade se o único modelo que conhecemos é esse? É difícil criar algo que não sabemos bem o que é. Mas uma coisa é certa: é preciso romper!
Uma ruptura radical de paradigmas, deixar tudo pra traz. Não se trata de um resgate a antigas civilizações, porque esse mito da natureza intocada pelos primeiros povos que habitaram a Terra caiu cedo nos meus estudos de ecologia. Trata-se de uma reconstrução, começar quase que do nada. Algumas iniciativas tem surgido aqui e ali, acho que muitas pessoas tem começado sua busca para fora da fumaça.
Sim, nós temos que abandonar as cidades. É chegada a hora do êxodo urbano. Precisamos aprender a plantar nosso próprio alimento, livre de venenos. Precisamos aprender a tratar nossas doenças e, mais importante, a preveni-las. A grande maioria das doenças modernas são causadas pelo nosso estilo de vida. Um estilo de vida doente, ajustado a uma sociedade doente só pode resultar em indivíduos doentes.
Mas como fazer isso?
Atualmente eu vejo que essa é uma luta muito maior do que parece. Essa estrada, que nos conduz para fora da cidade e para dentro de uma vida nova, auto gerida e autossustentável, é a mesma estrada que nos conduz num caminho de espiritualidade. E eu não estou falando de religiões e pregações de medo e culpa. Estou falando de um encontro interno, algo que somente quando se está na estrada, fora da zona de conforto, conseguimos alcançar. Um encontro com nosso verdadeiro EU. Uma jornada como essa nos conduz pelas estradas que existem em nós mesmos. Um amigo me enviou uma frase que recebi quando estava na estrada, que dizia assim:
"A viagem não começa quando se percorrem distancias, mas quando se atravessam nossas fronteiras interiores".
Hoje compreendo plenamente esse significado.
Quando se está fora da zona de conforto, vivendo experiencias novas, conhecendo pessoas novas, ouvindo o que elas tem a te dizer, começamos a nos analisar de forma diferente, sob outra perspectiva. Entendemos que muitas coisas que julgamos necessárias em nossas vidas são falsas necessidades, implantadas pelo sistema, e conseguimos levar essa reflexão bem mais a fundo, a ponto de constatarmos que vivemos muito bem com apenas alguns pares de roupa e suplementos. Na verdade, tudo o que é essencial cabe em uma mochila! O resto é absolutamente supérfluo!
Então por que não largar tudo agora? Foi a mesma pergunta que fiz ao meu amigo. Será medo? Temos medo do julgamento que farão de nós? Temos medo de fracassar e acabar voltando para a zona de conforto com o rabinho entre as pernas? E se eu largasse tudo mesmo? O que me prende aqui?
Essas foram perguntas que também fiz a mim mesma enquanto dividia os dias e a estrada com meu amigo. Mas como eu também já disse, as fronteiras são interiores. E foi aí que percebi que meu medo não era externo, não era o medo de morrer na estrada ou de ser rotulada disso ou daquilo. Não. O medo era em saber se estaria fazendo a coisa certa pelos motivos errados. Será que eu estaria largando tudo realmente para construir algo novo ou para fugir de algo que na verdade está dentro de mim e eu não consigo encarar?
Eu ainda não consegui responder a essa pergunta. E acho que enquanto não conseguir respondê-la o melhor caminho continua sendo esse que tenho seguido, caminhando pelas descobertas e quebras de paradigmas com calma e num ritmo mais lento. Porque se de fato o intuito for a fuga, você não chegará a lugar nenhum, embarcará apenas numa estrada circular que o trará sempre de volta ao mesmo lugar. Esse caminho é interno, e não podemos fugir de nós mesmos, não podemos fingir algo que não somos.
Sim amiguinho, talvez seja melhor mesmo esperar se formar. Vamos graduar nessa escola, adquirir o knowhow de nossos sentimentos, angustias e frustrações para que possamos estar prontos para fazer a coisa certa pelos motivos certos. Porque eu já não tenho duvidas que abandonar esse estilo de vida é a coisa certa a se fazer, mas é preciso estarmos certo do por que o fazemos, e aí deixamos que a Mãe Terra nos aponte o norte. Esse dia chegará em breve. O recomeço já não tardará. Se tudo der CERTO, largo tudo e viro hippie.
Prazer, meu nome é Mariany,
ResponderExcluirsei que já faz muito tempo em que vc postou esse texto maravilhoso,
no qual me indentifiquei completamente!
Enfim, não sei se já conquistou teu objetivo, que é assim como o meu,
minha dúvida e o que ainda me prende a esta bola de fumaça poluente, é minha família, minha avó e minha mãe, as quais sou muito apegada, e não largaria nada para deixa-las aqui sozinhas, apesar de que toda a família se encontra presente aqui, mas eu sinto essa vontade de liberdade, preciso disso, mas tenho a mesma dúvida que tens, o mesmo medo.. e o que mais me amedronta é ir contra a alegria da minha mãe, quero ser motivo de alegria e orgulho pra essas duas que comentei e que amo demais, sou nova, eu sei, ainda tenho que decidir o que farei da minha vida, já tive algumas decisões, e ainda terei que as cumprir, tenho 17 anos, estou no ultimo ano do Ensino Médio, pretendo fazer faculdade de Psicologia, apesar de que, andei mudando de ideia, apesar de não fazer mínima ideia se eu seria boa com a natureza, trabalhando com ela, até pensei em ser biológa, ou algo do tipo, apesar de que acredito que eu não me dê bem, apesar de que quero aprender, pra utilizar essa aprendizagem durante minha vida, se Deus quiser, minha vida de hippie.. enfim, não sei quais atitudes tomar.. estou meio perdida nos meus próprios pensamentos.. '-' desculpe-me o incomodo, e parabéns pelo texto maravilhoso!